É muito comum empresas que se desenvolvem economicamente, precisarem migrar para outro regime tributário como o Lucro Real, por exemplo, então começam a questionar se precisam ter contabilidade regular.
Em resposta a essa questão, a contabilidade não deveria estar associada exclusivamente ao crescimento da empresa, ou até mesmo seu regime tributário que é a forma de se calcular e recolher tributos, mas sim obrigação inerente a todas as pessoas jurídicas.
Não há uma generalização, pois existem empresas muito organizadas que fazem tudo de forma coordenada, mantêm contabilidade regular, não misturando patrimônio da empresa com os sócios e em acordo com a essência, mesmo sendo pequena ou Simples Nacional. Todavia, é importante chamar atenção sobre esta distorção de entendimentos para alguma delas.
Outro ponto que desperta atenção é quando o próprio contador faz esse tipo de alegação, dizendo que a empresa, por estar num determinado regime de tributação está dispensada de ter contabilidade. Confundindo assim a interpretação das legislações e autonomias de leis.
Levando em consideração que a maioria das empresas no país são optantes pelo Simples Nacional, significaria que a contabilidade seria ciência para a minoria e assim, sem qualquer relevância no papel econômico das empresas como um todo. Mas, e aquela conversa de que contador é necessário para todas as entidades no país?
Vamos aos fatos regulamentares: o argumento de que empresa optante pelo Simples, e que por isso não precisa ter contabilidade regular, não se sustenta ao analisar o previsto na Lei 10.406/2002, do Código Civil, artigo 1.179 que determina que empresário e sociedade empresária são obrigados a seguir um sistema de contabilidade, mecanizado ou não. Afirma ainda o artigo, que deve ser correspondentes a documentação respectiva e obriga também a todos estes a levantarem balanço patrimonial e de resultado econômico. Esta mesma disposição que obriga, em seu parágrafo segundo, dispensa o pequeno empresário previsto no artigo 970 desta mesma lei.
Desta forma, podemos levar em consideração que todas as empresas estão obrigadas a ter contabilidade regular, em conformidade com os fatos ocorridos e documentos gerados, levantar Balanço Patrimonial e DRE, com exceção ao MEI (Microempreendedor Individual) que, apesar de não ser obrigado, é sim recomendável.
E para enfatizar ainda mais o papel do contador nesse processo, o artigo 1.182 do Código Civil, determina que o levantamento dessas demonstrações e livros contábeis, devem ser feitos exclusivamente por contabilista legalmente habilitados para tal.
Mas a culpa dessa “cultura” defendida por tantos, de que empresa do Lucro Real é a única que tem por obrigação “fazer tudo certinho”, ou seja, ter uma contabilidade regular, está no fisco, especialmente no Decreto 9.580/2018 em seu artigo 600, que determina que a pessoa jurídica habilitada à opção pelo lucro presumido deverá manter escrituração contábil, conforme previsto no inciso I, porém, o parágrafo único, dispensa desta, quando há registro de livro caixa, no qual mantenha a escrituração total de movimentação financeira e bancária pelo estabelecimento.
Já o artigo 27 da Lei Complementar 123, define que a Microempresa e Empresa de Pequeno porte poderá por sua vez, manter uma contabilidade simplificada o que foi logo desmistificada pela Norma Brasileira de Contabilidade NBC 19.13.
É preciso ter muita cautela ao estudar a legislação tributária, no que diz respeito a liberar a empresa de escriturar contabilidade regular, afinal o fisco é um dos inúmeros usuários desses instrumentos: relatórios contábeis.
Afirmar que a empresa não precisa ter contabilidade regular porque o fisco libera dessa obrigação, seria o mesmo que afirmar que não precisa ter contabilidade regular, porque o banco só exige uma declaração simples de faturamento, ele é um dos usuários e não cabe a empresa assumir o ponto de vista de um ou de outro, e sim atender o previsto pela legislação Civil que neste caso, terá competência para regular a matéria.
Importante ressaltar que, além de ser uma obrigação prevista pelo código Civil, os relatórios contábeis são peças fundamentais para os usuários destas, na tomada de decisões estratégicas do negócio e deverá sim, ser implementado para todas as empresas, não pela obrigação, mas sim por sua utilidade fundamental. E mais importante, é ter um profissional contábil capacitado e competente para isso!
Por Priscila Maluzza Pissinato, Coordenadora do Curso de Ciências Contábeis, Gestão Fiscal e Tributária, Pós em Planejamento e Gestão Avançada de Tributos da UniPaulistana
Fonte
www.jornalcontabil.com.br