Em junho, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) admitiu que direitos possessórios alcancem imóveis que não estão escriturados em partilhas de bens. O STJ entendeu que, apesar da escritura e do registro serem atos necessários e obrigatórios, conforme descrito na Lei nº 6.015/73 (Lei de Registros Públicos), o acervo de bens sujeitos à partilha deve abranger todos os bens e direitos com indiscutível expressão econômica, tais como os direitos possessórios no caso.
A decisão foi tomada a partir de um recurso especial ajuizado por herdeiros que buscavam partilhar esses direitos possessórios sobre 92 hectares de terra em uma fazenda no município de Teófilo Otoni, no interior de Minas Gerais. Tanto no primeiro quanto no segundo graus, os herdeiros tinham tido esse direito negado por não haver escrituração da área e nem o registro no cartório.
A decisão do STJ, favorável aos herdeiros, oferece um precedente que reconhece situações comuns de irregularidades alheias aos titulares da herança que os impossibilitam de solucionar ou até mesmo considerar tais bens e direitos sujeitos à sucessão. O reconhecimento pelo STJ da autonomia existente entre o direito de propriedade e o direito de posse já foi reconhecida pelo STJ em outras ocasiões, como por exemplo, na possibilidade de penhora dos direitos possessórios e de indenização no caso de desapropriação.
É muito comum essa confusão entre propriedade e posse em casos de partilha tanto em inventários como divórcios, sobretudo pelo entendimento de que o reconhecimento da posse deveria ser pleiteado em vias ordinárias para a devida regularização. Ocorre que não considerar tais bens e direitos, muitas vezes de alto valor econômico, como passíveis de sucessão ou partilha é bastante equivocada.
A herança é o conjunto de bens, direitos e obrigações deixados por uma pessoa falecida. Por isso, negar a partilha de direitos reais, muitas vezes de valor econômico elevado, vai de encontro com preceitos básicos do Direito das Sucessões.
Dessa forma, o Acórdão da decisão do STJ (REsp 1.984.847/MG) determinou o prosseguimento à ação de inventário determinando a apuração dos requisitos configuradores do direito possessório suscetível de partilha entre os herdeiros. Na decisão, a relatora Nancy Andrighi afirmou que a melhor solução está na possibilidade de partilha de direitos possessórios quando não há a má-fé pelos possuidores, a fim de resolver a questão da sucessão.
Porém, é importante destacar que o entendimento do STJ não abarca a regularização da propriedade sobre o imóvel, mas apenas a transmissão de direitos para os herdeiros no âmbito do inventário, o que não impede que a formalização da situação de fato seja buscada nas vias oportunas. Trata-se, portanto, de uma importante decisão que visa oferecer mais celeridade e autonomia ao processo de direitos sobre as posses e ao processo de partilha de bens, deixando questões relacionadas à regularização para um segundo momento. O ideal, porém, é que os imóveis estejam sempre escriturados a fim de se evitar a existência de futuros problemas em relação à partilha desses bens.
Por Felipe Russsomanno e Vinicius Martins, advogados associados sênior do Cescon Barrieu Advogados nas áreas de Planejamento Patrimonial e Sucessório e Imobiliário, respectivamente
O Cescon Barrieu é um dos principais escritórios de advocacia do Brasil, trabalhando de forma integrada em cinco escritórios no Brasil (São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador e Brasília) e, também, em Toronto, Canadá.
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