No capítulo 19 do evangelho de S. Lucas, a partir do versículo 11, Jesus conta uma parábola a respeito de um rei que, às vésperas de uma longa viagem, distribuiu uma mina a 3 servos. Na volta, o rei pergunta a 3 desses servos o que fizeram com o dinheiro. O primeiro multiplicou a sua mina por 10, ao passo que o segundo conseguiu, a partir de sua mina, conquistar mais 5.
Já o terceiro servo devolveu sua mina intacta e confessou ao rei que teve medo de investi-la e perder dinheiro. O soberano lhe fez uma séria repreensão, alegando que a mina poderia ter pelo depositada em um banco para ter algum rendimento. O servo perdeu a sua mina, que foi concedida ao servo que teve melhor desempenho.
Essa parábola serve como advertência a gestores, independentemente do porte de seus empreendimentos, que é necessário descobrir soluções criativas e econômicas para captar dinheiro e investi-lo da forma mais lucrativa possível.
A negociação de ativos judiciais, também conhecidos como créditos estressados, pode ser essa solução. Trata-se da possibilidade legal de o credor transferir o montante a ser recebido a terceiro por meio de negociação privada, independente da concordância do devedor.
Ativos judiciais são o montante depositado pelo autor da ação como provisão para o pagamento de um litígio, que pode ser um processo na área civil, tributária, trabalhista ou contra órgãos públicos, os precatórios.
A regulamentação da operação está no artigo 286 do Código Civil, que a define como uma operação de compra e venda, onde o autor da ação cede o valor do depósito realizado correspondente ao valor pleiteado na ação, descontando um valor de deságio, que será estudado por alguns coeficientes como: natureza da ação, risco, estimativa de cumprimento de sentença, por exemplo.
A cessão de créditos estressados tem algumas vantagens: o autor original da ação recebe o valor em um prazo bem curto o que, considerando a morosidade da justiça brasileira, que pode levar anos ou décadas para proferir a decisão final, torna-se um bom negócio.
O cedente pode investir os recursos por exemplo, em modernização das operações, ampliação dos negócios, adimplemento de obrigações relacionadas ao plano de recuperação ou depositá-los em aplicações com maior rendimento.
E] não é pouco dinheiro: dados referentes a 2020 apontam que o volume de créditos inadimplidos entre 90 e 180 dias no Brasil atingiu a impressionante marca de R$ 84 bilhões, dos quais R$ 62,7 bilhões referem-se ao mercado consumidor e R$ 21,7 bilhões ao corporativo.
Segundo relatório do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), de 2021, há 19 milhões de ações em curso só no Estado de São Paulo, e 58,3 milhões no país.
Esse montante estimulou a formação de um mercado de fundos especializados na negociação desses ativos, cujo trabalho é identificar esses valores e busca oferecer situações e oportunidades de solução.
Se, por um valor considerado baixo, o rei se irritou com a inércia de seu servo que, apesar da boa vontade, não procurou rentabilizar o investimento, imagina a fúria soberana ao saber que, você, gestor jurídico, por desconhecimento ou mesmo por falta de tempo, está deixando de considerar uma ação que pode trazer capital para o seu escritório e a empresa do seu cliente?
Por Bruno Bom, CMO da M4 DISTRESSED ASSETS
Fonte
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